A Galeria da Liberdade foi aberta no dia 18 de junho, às 9h, com a exposição “Negro é um rio que navego em sonhos”. O espaço, gerido pelo Museu da Imagem e do Som do Ceará (MIS CE), faz parte do conjunto arquitetônico do Palácio da Abolição. O MIS integra a Rede Pública de Equipamentos Culturais (RECE) da Secretaria da Cultura do Ceará, com gestão parceira do Instituto Mirante.
A criação da Galeria da Liberdade afirma a centralidade da luta pela garantia de direitos humanos na construção de uma sociedade mais democrática e diversa, na qual a cultura e a educação são fundamentais para o exercício pleno da cidadania e o combate ao racismo. O edifício sediou o antigo Mausoléu Castelo Branco. Inicialmente, o horário de funcionamento será quarta e quinta-feira, das 10h às 18h, e sexta e sábado, das 13h às 20h.
A Galeria da Liberdade se estabelece como um espaço de difusão, com mostras que têm como eixo a luta pelos direitos humanos no Ceará, no Brasil e no mundo, evidenciando as tramas políticas, geográficas e afetivas da História. Trata-se de um lugar de experimentação artística, no qual o som e a imagem narram o passado e fazem imaginar, coletivamente, outros futuros.
“Nós estamos muito alegres de poder estar entregando ao povo cearense, ao povo de Fortaleza, a Galeria da Liberdade, que vai servir para o nosso povo ver exposições, participar de rodas de conversa, de debates, discussões em um espaço que é de unidade do povo cearense. Aqui é a sede do poder político cearense, aqui é o Palácio da Abolição e teremos agora a Galeria da Liberdade. É um espaço para superarmos o racismo, superarmos preconceitos e garantir que tenhamos sempre a manifestação em favor da democracia, dos direitos humanos e da liberdade do nosso povo”, disse o governador Elmano de Freitas durante a abertura.
A secretária de Cultura, Luisa Cela, também destacou o simbolismo da abertura do espaço. “A Galeria da Liberdade é a expressão concreta de uma política cultural comprometida com a democracia, a memória e os direitos humanos. Ressignificar esse espaço, que por tantos anos abrigou o antigo Mausoléu Castelo Branco, e agora destiná-lo à arte, à memória e à experimentação é um gesto político e simbólico. Transformá-lo em lugar de criação, difusão artística e reflexão crítica é um passo fundamental para reafirmarmos o papel da cultura na construção de futuros mais justos. Sob uma gestão pública voltada para a valorização da arte e da liberdade, este equipamento se torna símbolo da força criadora que resiste, reinventa e repara acontecimentos em prol de uma sociedade mais humanizada e plural”, disse a secretária.
O espaço afirma-se também como um local de encontro para diversos públicos e vozes, buscando construir diálogos profundos na revisão das estruturas que ainda discriminam e violentam pessoas cotidianamente. A Galeria da Liberdade será coordenada pela historiadora Cícera Barbosa, mestra em História Social (UFC). Serão realizadas no local exposições, aulas abertas, seminários, rodas de conversa e outras ações formativas gratuitas e abertas ao público.
O MIS já vem realizando, desde dezembro de 2024, o projeto Rotas da Memória, também sob a coordenação de Cícera Barbosa. Nas mais de 30 edições concluídas, a iniciativa promoveu visitas mediadas a monumentos e edificações históricas que preservam memórias de enfrentamento ao período colonial, de iniciativas que contribuíram para a liberdade e de resistência à ditadura militar no Brasil. A ação já contemplou cerca de 1.200 pessoas.
A abertura da Galeria da Liberdade representa um marco para o cenário cultural no Ceará. O trabalho relacionado aos temas de memória, verdade e justiça e liberdade será desenvolvido pela equipe do MIS. “Com a criação da Galeria da Liberdade, se afirma a centralidade da luta pela garantia de direitos humanos na construção de uma sociedade que busca ser mais diversa, justa e saudável. Nesse contexto, cultura e educação são fundamentais para o exercício pleno da cidadania”, destacou a coordenadora da Galeria, Cícera Barbosa.
Durante a solenidade, o presidente do Instituto Mirante, Tiago Santana, ressaltou a relevância da gestão estadual abrir a Galeria da Liberdade como um espaço ressignificado. “Isso reverbera no estado do Ceará, no Brasil, na América do Sul e no mundo. É uma decisão muito correta. A gente está aqui no Palácio da Abolição, faz todo sentido ter a Galeria da Liberdade. Esse é um espaço onde a arte e a cultura podem ajudar a nunca esquecer [o que houve durante a ditadura]”, disse Tiago Santana.
“É uma grande honra o MIS ampliar sua atuação passando a gerir a Galeria da Liberdade. Esse espaço, agora ressignificado, oferece a possibilidade de a população aprender, refletir e conhecer mais sobre a própria história, sobre a relevância de garantir conquistas relacionadas à liberdade e à democratização no Brasil. Esse debate precisa ser feito de forma recorrente e acolher todos os públicos”, explica o diretor do Museu, Silas de Paula.
Exposição em cartaz
A Galeria da Liberdade conta com a realização da ocupação a céu aberto e nos espaços de galeria “Negro é um rio que navego em sonhos”, que tem curadoria de Ana Aline Furtado. “A proposta curatorial parte da memória coletiva e dos modos de viver, de resistir, de sonhar, de produzir, de cuidar, de cantar, de escutar, de observar o céu, de rezar, de realizar e de construir novas memórias para a geografia da cidade”, ressalta a curadora.
As obras que integram a exposição são de Alexia Ferreira, Blecaute, Cecília Calaça, Clébson Francisco, Darwin Marinho, Roberto Silva, kulumyn-açu, Luli Pinheiro, Suellem Cosme, Trojany e Wellington Gadelha. “Negro é um rio que navego em sonhos” propõe-se a abrir o espaço a céu aberto para repensar a presença negra e indígena neste estado.
A mensagem que a Galeria da Liberdade pode transmitir a partir de agora, segundo a curadora Ana Aline Furtado, é “pensar a convivialidade que pode ser gerada com a ocupação, restaurando novos regimes de produção de memória a partir do mesmo espaço, instaurando presenças capazes de reorganizar os significados simbólicos dessa monumentalidade na paisagem urbana e na mobilidade dos indivíduos. Para quais espaços curar quais obras? Que obras possuem o poder de curar a ferida que a colonização criou? Ser conhecido nominalmente é uma afirmação de presença. Não repetir o nome. Falar os nomes que nunca são ditos”, destaca Ana Aline Furtado.
Em cada lado do prédio que abriga a Galeria, estão adinkras (símbolos ideográficos, parte da cultura do povo Akran, na África Ocidental) e imagens de mulheres negras que são e que foram referências para o movimento negro no Ceará: Ana Souza, Balbina, Cris Faustino, Cristina Nascimento, Dediane Souza, Elissânia Oliveira, Joelma Gentil do Nascimento, Joseli N. Cordeiro, Laura Gomes, Lourdes Vieira, Preta Tia Simôa, Sandra Petit, Teresa Soares, Veronizia Sales e Wanessa Brandão. Elas simbolizam lideranças negras na contemporaneidade e representam também a trajetória de muitas outras mulheres que lutaram pela liberdade no Brasil.
“Você as escuta, mas não sabe de onde elas vêm. Você nunca as viu. A lida com a ausência é física. Você sente no corpo. O corpo que é o nosso lugar de existir, de reinventar, é também, neste momento, o lugar do fazer, o lugar do contar e do cantar as vozes que nos lembram de pedir por justiça. As mulheres negras são o fundamento da história do nosso povo. [Uma após outra]. É por essa razão que repetimos o nome umas das outras, para assentar nosso corpo no mundo e na história que agora nós mesmas escrevemos!”, ressalta a curadora Ana Aline Furtado sobre a exposição que estará em cartaz durante a abertura da Galeria da Liberdade.
A exposição “Negro é um rio que navego em sonhos” parte de um conhecimento íntimo de cultura de resistência nas diásporas, explica a curadora. Ana Aline revela, ainda, a intenção de criar pontos de referência comum para fortalecer os saberes tradicionais, ancestrais, os modos de viver, de contar história, de dançar, de rezar e de firmar presença no mundo. As imagens que não existem, as imagens não encontradas também são destacadas pela mostra. As mulheres negras que fizeram história também não têm rostos conhecidos.
“Nós nos buscamos e não nos encontramos. Em nosso corpo estão contidos todos os tempos. A falta da imagem nos acompanha, não nos assombra. Isso já foi utilizado contra os povos indígenas, contras os povos africanos e afrodescendentes e, apesar disso, nós permanecemos. A imagem não está aqui. Eu estou. Você está. Quando digo isso, escuto a voz de Beatriz Nascimento falando: “onde eu estou, eu estou, quando eu estou eu sou”, e ao ouvi-la, percebo que nessa aparição coletiva nós rompemos com a ausência e fincamos raízes na presença, aquela que é constituinte de nossa imagem-identidade enquanto povos que somos”, diz um trecho do texto curatorial da exposição. “Negro é um rio que navego em sonhos” provoca a reflexão sobre quem, de fato, tem direito à memória e sobre o racismo contido na afirmação de que não haveria negras e negros no Ceará.
Histórico e características do espaço
O espaço onde está localizada a Galeria da Liberdade faz parte do conjunto arquitetônico do Palácio da Abolição projetado pelo arquiteto Sérgio Bernardes. A proposta é uma obra de arquitetura moderna de reconhecido valor, estas características já fazem parte da paisagem urbana de Fortaleza de maneira qualitativa. O prédio foi criado em 1972, dois anos após a inauguração do Palácio da Abolição, em homenagem ao ex-presidente da República, o cearense Humberto Castelo Branco. A área total da edificação é de cerca de 300 metros quadrados. Há duas galerias laterais que totalizam 220 metros quadrados (110 metros quadrados cada) e uma área fechada de 58 metros quadrados.
Serviço
Galeria da Liberdade
Avenida Barão de Studart, 505 – Forteleza/CE
Horário de funcionamento da Galeria da Liberdade:
quarta e quinta-feira, 10h às 18h, sexta e sábado, das 13h às 20h